Cyro Monteiro, grande sol no céu do samba, nascia há 109 anos 28/05/2022 - 09:00

Thobias de Santana

Se pudéssemos visualizar um mapa musical do Brasil, o samba seria o gênero com brilho mais intenso. Um imenso estado, um estado de graça. Verdadeira coluna que sustenta a música brasileira, o samba teve origem nas ricas rodas de alegria realizadas inicialmente por afro-brasileiros. O gênero ajudou a integrar o país com suas festas, reuniões nos quintais, casas, bares, praças e ruas. Uma sagrada vocação natural para agregar. Olhando para o céu, a olho nu, Sirius é a estrela mais brilhante vista da Terra. Agora, se fosse possível visualizar um mapa do samba no Brasil, uma das luzes mais intensas teria como nome Cyro Monteiro, um gigante de luz, a encarnação do espírito do samba, carinhosamente apelidado de Formigão.

Cyro Monteiro, que nasceu no Rio de janeiro no dia 28 de maio de 1913, foi criado em Niterói, onde iniciou sua história com a música e com o rádio, na década de 1930, apresentando-se várias vezes na “Rádio Clube Fluminense”, com Careno, um dos seus oito irmãos.

Conexões e constelações
Os irmãos Cyro e Careno eram acompanhados por Eliziário Peixoto, irmão da mãe de Cyro e pai de Cauby Peixoto. Com o fim da dupla Sílvio Caldas & Luís Barbosa, duas grandes feras em pleno início de carreira, Silvio convidou Cyro para formar dupla com ele no programa do radialista Ademar Casé, avô de Regina Casé, considerado o inventor da cultura do entretenimento de massas no país. Cyro Monteiro jogava no Fluminense de Niterói quando surgiu a oportunidade de trabalhar na rádio Mayrink Veiga, onde ingressou e, em pouco tempo, alcançou o nível do primeiro time dos artistas da rádio, uma constelação com Aurora e Carmem Miranda, Noel Rosa, Francisco Alves e outros. Em 1937 se casou com a cantora Odete Amaral. 

Cyro materializou sucessos como “Se Acaso Você Chegasse”, de Lupicínio Rodrigues e Felisberto Martins, e “Os Quindins de Yayá”, do próprio Cyro em parceria com Ary Barroso. Atuou na famosa peça “Orfeu da Conceição”, de Vinicius de Moraes, e em programas importantes como “Bossaudade” e “O Fino da Bossa”. Além de cantor de samba e compositor, Cyro Monteiro era famoso por ser um grande sujeito, bom amigo, ótima companhia e papo. Para Vinicius de Moraes, Cyro Monteiro era um grande abraço na humanidade. Cyro era famoso, também, por utilizar, muito bem, a caixa de fósforos como instrumento de percussão enquanto cantava, como um mestre, os sambas sincopados. Muitos atribuem ao Formigão essa invenção.

Cyro Monteiro enfrentou, no início da década de 1950, uma tuberculose que o afastou do samba por muitos anos. Nos anos 1960, materializou um grande trabalho chamado “Senhor Samba” e, na sequência, passou a fazer competentes e divertidas apresentações com Elizeth Cardoso, “A Divina”. Vale muito a pena conferir essa parceria, bem como o trabalho gravado ao vivo no formato LP com Dilermando Pinheiro, ou seja, é tudo muito bom. E esse espírito alegre encarnado do samba, claro, rendeu muitas histórias.

O Sr. Brasil, Rolando Boldrim, conta muito bem uma delas. Cyro Monteiro, o Formigão, foi até a casa de Cartola comer uma feijoada feita por Dona Zica. Cyro era conhecido por ser bom de papo, de samba e de garfo, então, iniciou os trabalhos de degustação logo cedo, petisco daqui e dali, depois feijoada repetidas vezes. Resultado: foi ao banheiro, teve um tremendo mal-estar e se encostou onde deu, aguardando socorro, o que não demorou. Aquela tensão no ar, grande correria, infarto era o diagnostico mais comentado. Dona Zica preparou rapidamente um chá forte e quente com vários tipos de folhas do quintal. Era evidente que a grande quantidade de comida consumida por Cyro era a causa do mal-estar e, para salvar a vida do amigo, Dona Zica disse: Tome o chá, Cyro, isso vai te ajudar. Cyro Monteiro pegou o chá, olhou com carinho para Dona Zica e mandou essa: “mas não tem uma bolachinha?”