Disponível na MUBI, “O Bandido da Luz Vermelha” é a explosão do terceiro mundo em forma de filme 27/06/2023 - 16:06

Felipe Worliczeck*

As maiores revoluções na arte vêm justamente daqueles que pretendiam destruí-la. Rogério Sganzerla queria mesmo era uma explosão: do cinema e do terceiro mundo junto com ele. “O Bandido da Luz Vermelha” (1968) - primeiro filme do cineasta, disponível na Mubi a partir desta terça-feira, 27 de junho - é a obra que materializa o espírito anarquista de seu criador, pioneiro do cinema marginal, movimento que surgiria com o declínio do cinema novo e desembocaria nas polêmicas porno-chanchadas (veja trailer abaixo).

A desconstrução completa é o elemento central do universo que Rogério Sganzerla nos propõe. Mesmo os fatores externos à obra e narrativa, como sua classificação em gêneros cinematográficos, encontram dificuldade em descrevê-la. “O Bandido da Luz Vermelha” é um faroeste terceiro-mundista, mas também é um pulp B e horror slasher.

A narrativa, por sua vez, gira em torno de Jorge (Paulo Villaça), um criminoso que ficou conhecido pela opinião pública a partir de uma exposição midiática policialesca por seus métodos inusitados e, claro, a lanterna com luz avermelhada que usava. O filme inverte a narrativa para sua época, retratando a vida extravagante que Jorge conquista a partir de seus crimes, ao invés de focar no castigo que ele merece, em uma pretensa moral punitivista.

Junto ao filme, Sganzerla também publicou um manifesto sobre suas pretensões com a obra, originando o que é hoje conhecido como Cinema Marginal. Os filmes deste movimento se constituíram após a imposição do AI-5 pela ditadura militar, restringindo a liberdade e fôlego dos artistas do Cinema Novo.

O Cinema Marginal, portanto, surgiu como uma alternativa viável, política e econômica, de se falar da realidade brasileira. Os cineastas do Cinema Marginal - entre eles Sganzerla e Júlio Bressane - foram influenciados pelo tropicalismo e pelo cinema de Jean-Luc Godard, criticando o Cinema Novo pela criação de “filmes ininteligíveis", focando agora na indústria cultural norte-americana de cinema B. 

“O Bandido da Luz Vermelha” se enquadra em todos estes quesitos, mais evidentes em sua montagem fragmentada e frenética, muito semelhante à filmes da nouvelle vague francesa como “O Acossado” (1960). 

Essa desconfiguração da forma fílmica em seus diferentes aspectos é justamente o que une a narrativa desconjuntada da obra, tornando o caos da Boca do Lixo, região em que a obra foi gravada, um sentimento palpável no filme. 

Com o lema “o terceiro mundo vai explodir”, o filme é, sem dúvidas, uma bomba na prática cinematográfica brasileira vigente na década de 1960. Apesar de sua substituição pelas porno-chanchadas, mais comercialmente viáveis e responsáveis pela maior porcentagem de filmes brasileiros no cinema na história, “O Bandido da Luz Vermelha” é um filme que perpassa e explode qualquer barreira imposta a ele.

*Estagiário, sob supervisão de Cristiano Castilho