"Eduardo e Mônica" é fiel à música da Legião Urbana, mas ignora o rock nacional 27/01/2022 - 14:40

André Molina
Autor do livro “Música Urbana – O Início de uma Legião”


Baseado na canção homônima do cantor e compositor Renato Russo, o filme "Eduardo e Mônica", de René Sampaio, é uma adaptação cinematográfica que somou críticas positivas desde a sua estreia, em 20 de janeiro. Como na música, o longa-metragem – que segue em cartaz nos cinemas do Paraná - retrata a história de um jovem casal que aprende a conviver com as diferenças de costumes, origem e idade na Brasília dos anos 1980. Passagens da canção como "festa estranha com gente esquisita" ou "se encontraram então no Parque da Cidade, a Mônica de moto e o Eduardo de camelo" são facilmente identificadas e se relacionam bem com a memória afetiva de quem conheceu a faixa em 1986, quando foi lançada no álbum "Dois", da Legião Urbana.

Estes episódios de fidelidade parecem ter sido mais valorizados em "Eduardo e Mônica" do que no filme "Faroeste Caboclo" (2013), também de René Sampaio, que teve muitas críticas negativas, inclusive de fãs, devido às características que se diferenciavam da letra original do poeta do cerrado. Respeitar a liberdade dos idealizadores da obra é necessário, mas quando o assunto é Legião Urbana e Renato Russo, a expectativa dos fãs legionários é por uma releitura 100% fiel.

Como filme, "Eduardo e Mônica" tem muitas relações com "Faroeste Caboclo" -  dos cenários à época em que foi contextualizado. As duas faixas que inspiraram as produções apresentam diversas semelhanças, já que foram compostas por Renato Russo na fase "Trovador Solitário", quando o cantor caminhava pelas quadras de Brasília no início dos anos 80, se apresentando somente no formato voz e violão.

Assim como Renato Russo, o diretor espertamente pautou o filme com o clichê "os opostos se atraem", caracterizando Mônica, representada por Alice Braga, como uma jovem intelectual, médica e com 20 e poucos anos de idade, enquanto Eduardo (Gabriel Leone) é um adolescente de 16 anos, vestibulando, que "gostava de jogar futebol de botão com seu avô". Com a fidelidade em relação à letra da música e as atuações convincentes de Alice Braga e Gabriel Leone pontuando de maneira positiva para a obra de René Sampaio, o filme deixa a desejar em sua trilha sonora.

O repertório caracteriza bem a década de 1980, com bandas importantes em âmbito internacional, como A-ha, The Clash e The-B52s, mas “Eduardo e Mônica” valoriza pouco os grupos brasileiros. Na época retratada pelo filme, o rock nacional, principalmente o de Brasília, invadia as rádios, os canais de televisão e os quartos de adolescentes brasileiros. Era a onda do “BRock”, com bandas batendo recordes de vendagens de discos e ditando o perfil da juventude. Um filme que utiliza uma composição de Renato Russo como tema poderia aproveitar bem mais a sua obra e a dos colegas de geração.

Poucas referências musicais são expostas em "Eduardo e Mônica". Vale destacar a faixa-título nos créditos, "Geração Coca Cola" (Legião Urbana) e "Bichos Escrotos" (Titãs), na cena da "festa esquisita". Grupos brasilienses, como Plebe Rude e Capital Inicial poderiam ser citados para ilustrar a importância da Capital Federal na história do rock brasileiro. Se é válido enquanto adaptação cinematográfica, “Eduardo e Mônica” perdeu uma oportunidade de registrar para as novas gerações o real valor que o rock nacional tinha na década de 1980.