"Good Night, Oppy" humaniza, e embala com música, a saga dos robôs que exploraram Marte por 15 anos 02/02/2023 - 17:54

Beto Pacheco

Você sabia que, desde o Projeto Apollo, iniciado em 1961, a NASA tem como tradição acordar os astronautas com música? E você sabe, não se brinca com tradição. Foi desse modo que os robôs-gêmeos Spirit e Opportunity, este carinhosamente chamado Oppy, foram acordados do primeiro ao último dia de sua missão em Marte. E a primeira chacoalhada foi com “Born to be wild” (Steppenwolf)

Essa história é uma das tantas retratadas no documentário Good Night, Oppy" (2022), dirigido por Ryan White, e disponível na plataforma de streaming Amazon Prime Video. White juntou décadas de filmagens da NASA com efeitos fotorrealistas e animação da Industrial Light & Magic, a famosa empresa de efeitos visuais fundada por George Lucas - um cara que, convenhamos, entende de estrelas e planetas. 

Explorar Marte está em nosso imaginário há mais de século. E a emoção dessa conquista aparece no documentário já de cara, quando "Roam" (B-52's) ecoa na sala de controle do JPL - sigla em inglês para “Laboratório de Propulsão a Jato”. Momentos intercalados por depoimentos de pessoas que trabalharam ao longo de todos esses anos na missão. Inclusive uma jovem estudante que assistiu ao lançamento, em 2003, e, anos depois, se tornou parte da equipe. Eles relatam seus sentimentos, desde a fase de testes, quando cada um dos robôs, segundo os cientistas, demonstrava temperamento próprio. 

Spirit e Opportunity tiveram uma jornada que nenhum humano jamais viveu e sabe-se lá quando, e se, haverá de viver. Contudo, embora as espaçonaves fossem robóticas, a missão sempre foi humana. Projetados para durar 90 dias, os irmãozinhos robôs trabalharam por 6 e 15 anos respectivamente. Um sucesso absoluto e impensável, enviando durante todo esse tempo imagens e dados que mudaram completamente nosso entendimento sobre Marte. Inclusive sobre a presença de água em sua superfície. 

O roteiro e a edição são malandrinhos, antropomorfizam Spirit e Opportunity e nos fazem sentir empatia e emoções inesperadas pela dupla. Narrativa calorosa, envolvente, que, em dado momento, faz com que nos perguntemos se "Good Night, Oppy" não é um filme da Disney ou da Pixar. Não é difícil enxergar Wally, o primo criado em animação, nos “olhinhos” de Spirit, ou sentir tristeza pelo envelhecer de Oppy e a, digamos, artrite em suas articulações, causada pela poeira marciana.  

E, sim, cada passagem é pontuada pelas músicas que acordavam, dia a dia, os exploradores. Como quando Spirit é atingido por uma tempestade de poeira e precisa ser desligado para poupar energia. A equipe do JPL, com dificuldades para o religar, toca de modo esperançoso "S.O.S." (ABBA)

Spirit deveria ter andado 600 metros e funcionado por 92 dias. Durou 2.269. Em seus últimos suspiros, cientistas vão a talk shows para falar da façanha exploratória, a maior de nossa espécie (e dos robôs também) e acabam por estimular uma campanha que corre os Estados Unidos: “Save Spirit!".

Contudo, é quando Opportunity não consegue mais rodar, passados 5.498 dias, que o filme nos coloca contra a parede e os nossos olhos, aqueles que não são exatamente lentes de altíssima resolução, se enchem de água. Uma tempestade gigantesca circunda Marte e bloqueia o sol. A última mensagem do rover movido à energia solar para o controle da missão foi traduzida assim: "Minha bateria está fraca e está escurecendo".

Dias se passaram. Silêncio. Quando, enfim, a equipe da NASA percebeu que não havia volta, o chefe da missão ao longo de todos aqueles anos, que nunca havia escolhido sequer uma música para acordá-los, o fez, com "I'll Be Seeing You" (Billie Holiday)… Mas, dessa vez, era a última. O “boa noite” definitivo.

 

Confira abaixo uma playlist no Spotify com diversas músicas que, ao longo de 15 anos, acordaram os robozinhos exploradores de Marte: