João Gilberto e a música em dois tempos: antes e depois dele 10/06/2022 - 10:20

Thobias de Santana

Polêmicas, com ou sem dúvidas razoáveis, sempre existirão. Quem descobriu o Brasil? Pedro Álvares Cabral, Vicente Yañez Pinzón ou um antepassado distante do Sr. Martim Afonso de Sousa, o Arariboia? E a bossa nova, quem inventou? Será que descobertas e invenções podem ser atribuídas a uma única pessoa?

Talvez não. Mas no caso da bossa nova, não é possível deixar de destacar, com colossal ênfase, um baiano de Juazeiro, João Gilberto, que estreou no planeta no dia 10 de junho de 1931. Na adolescência, ganhou de seu pai um violão, instrumento que se converteria no imprescindível companheiro de toda uma vida. Morou em Aracaju, Salvador, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Diamantina, voltou para Juazeiro, passou novamente por Salvador e retornou ao Rio de Janeiro para cumprir o seu grande destino.

Em 1959, nasce novamente, desta vez como peça fundamental, com a gravação da canção “Desafinado”, num 78 rpm, e, principalmente, com o LP “Chega de Saudade”. Após esses eventos que flertavam com o sobrenatural e apesar dos sagrados profetas musicais pretéritos e dos apóstolos do futuro, a música brasileira ficou dividida entre aJG e dJG, ou seja, antes de João Gilberto e depois de João Gilberto.

Ele revolucionou a música brasileira com sua forma peculiar de cantar e tocar violão. O jeito inovador, absolutamente original, uma verdadeira bossa nova, dominou São Paulo e, na sequência, todo o país. Mais ainda: difundiu e valorizou a música brasileira na Europa, no Japão, nos EUA. e, claro, em países da América do Sul como Argentina (João Gilberto recebeu, em Buenos Aires, as chaves da cidade) e Chile.

O novo caminho apontado por João Gilberto foi tão impactante e transformador que influenciou nomes como Toquinho, Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil e, possivelmente, todos os outros. Vale lembrar que Gil, inclusive, deixou o acordeon, aos 17 anos, para pegar o violão, isso após ouvir no rádio, pela primeira vez, “Chega de Saudade”, com João Gilberto. Essa influência foi exportada, pois é notória a divina intervenção da técnica de João Gilberto, por exemplo, no mundo do jazz.

Residiu muitos anos nos Estados Unidos, após ter se apresentado no Festival da Bossa Nova no Carnegie Hall. Lançou e relançou trabalhos naquele país, onde morou até 1979, quando retorna ao Brasil.

João Gilberto conquistou prêmios relevantes, como o Grammy (só com o LP Getz/Gilberto recebeu quatro de nove indicações), venceu em 1964 como Álbum do ano e, no ano de 2000, venceu como melhor Álbum Mundial com “João Voz e Violão”. Em 1963, também com o álbum Getz/Gilberto, João permaneceu no 2º lugar da revista Billboard por 96 semanas, figurando entre os 25 discos mais vendidos daquele ano.

Sua importância na criação e difusão da Bossa Nova é incontestável. De fato, com tantos nomes de peso participando da renovação da música brasileira naquela época, é difícil afirmar que alguém é pai disso ou daquilo. Por outro lado, se fosse possível a coleta do sangue bom da bossa nova, verificaríamos que grande parte desse material genético é compatível com o do gênio João Gilberto.