Leminski, 79: Bruna Lucchesi dá vida à obra pouco conhecida do poeta em álbum com participação de Kiko Dinucci 23/08/2023 - 16:39

O registro preciso e a intensidade do trabalho de Bruna Lucchesi, gravado em fonogramas há apenas quatro anos, com o lançamento do single "Antes de libertar", em 2019, ganha agora profundidade ímpar. A artista curitibana, elogiada por seu timbre pouco usual e canto expressivo, lança seu segundo álbum, e marca um novo lugar para sua música. "Quem faz amor faz barulho" chega às plataformas de streaming pelo selo Pequeno Imprevisto e revela um mergulho da cantora e compositora na obra de Paulo Leminski, que completaria 79 anos nesta quinta-feira (24). Não seus poemas, editados em livros esgotados e celebrados pelo público. O que Lucchesi traz no disco, que marca um salto em sua carreira, são interpretações únicas para as composições de Paulo Leminski, que além de poeta, tradutor e ensaísta, também se dedicou a fazer canções, em letras e músicas.

Ao longo de 12 faixas, Bruna dá vida a músicas adormecidas em registros quase desconhecidos, dá corpo a canções inéditas, e cria um cenário único para as músicas do poeta. Entre guitarras distorcidas, ou arranjos construídos na simplicidade, a artista chega a um álbum singular no cancioneiro brasileiro contemporâneo. Na obra, Lucchesi vasculha com amplitude as composições de Leminski, e constrói um arco incomum para a música pouco revelada do artista. Com arranjos curvos, fugindo de caminhos fáceis, mas que ainda assim conseguem soar populares, Bruna Lucchesi faz jus à obra do poeta, e engrandece sua expressão como compositor.

Sob produção de Ivan Gomes, e com arranjos coletivos feitos pela artista ao lado de Cecilia Collaço, Paulo Ohana, Vitor Wutzki e do próprio Ivan, "Quem faz amor faz barulho" celebra sob um viés insuspeitado o trabalho de um dos maiores nomes da cultura brasileira.

A conversa entre duas guitarras, pontuada pela bateria, cria a atmosfera perfeita para a abertura do álbum, que começa com canção homônima ao disco, "Quem faz amor faz barulho". O som do instrumento de Vitor Wutzki, entremeado pelo toque de Kiko Dinucci, entre marcações rítmicas de Cecília Collaço, soa como um elo perfeito entre Curitiba, cidade de origem de Paulo Leminski e Lucchesi, e São Paulo, onde a cantora e compositora curitibana gravou o trabalho. Há nesses poucos segundos de abertura melancolia, experimentação, e um embalo popular que vai conduzir toda a obra. 

Na seqüência, “O Velho Leon e Natalia em Coyoacán” - única gravação do disco feita a partir de poema de Leminski, aqui musicado por Vitor Ramil, que a gravou em 2000 -, tem atmosfera misteriosa, e revela desejos utópicos que unem gerações - de Leminski, passando por Vitor, até Bruna. Em "Valeu" - gravada em 1981 por Paulinho Boca de Cantor -, Bruna apresenta uma espécie de hino de esperança, num dos registros mais simbólicos do disco. As referências à John Lennon, trazidas por Vitor Wutzki, reafirmam a ambição da música. 

Já “Cigana", uma das canções inéditas de Leminski, traz versos ressentidos como “você me enganava malvada mal dava pra ver, nem prazer você dava”. Quinta canção do álbum, “Live With Me”, poema de William Shakespeare musicado por Paulo Leminski, traz um cenário rural que se conecta diretamente à artista, cujo pai é agrônomo. 

Sob guitarra com abordagem que remete aos faroestes, "Luzes" - já gravada por Arnaldo Antunes, em 2007, e por Estrela Leminski e Téo Ruiz em 2014 - reforça o caminho do disco, em seu papel de dar à obra de Leminski uma atmosfera própria, um contexto no qual as canções possam existir em conjunto, na coesão da leitura de Lucchesi.

“Energia Solar”, canção-fagulha que levou Lucchesi a ser convidada a participar do show comemorativo aos 75 anos de Leminski em Curitiba, é uma das inéditas do álbum, junto com Cigana e “Poeta”, composição de amor vulnerável, pautada pela simplicidade no arranjo do álbum.

Única música do álbum a contar com colaboração vocal, “Oração de um Suicida” - que traz participação de Paulo Ohana - tem caminho curioso em sua feitura. Inicialmente escrita por Pedro Leminski sobre uma decepção com a vida, a canção ganhou letra, música e uma segunda parte por Paulo Leminski, numa espécie de mensagem para levantar o astral. 

Fechando o disco, “Se Houver Céu” é a afirmação de Leminski enquanto compositor. A canção, de melodia exata e precisa, foi desenhada em uma entrevista emblemática de Leminski com Aramis Millarch, na qual o poeta quis conversar pessoalmente com o jornalista após não ser reconhecido como compositor. Essa foi também a última obra a entrar no repertório.

Sobre Bruna Lucchesi
A cantora e compositora curitibana Bruna Lucchesi é conhecida pela expressividade e precisão de seu canto. Já fez turnês pelo Brasil e alguns países da Europa e, nos Estados Unidos, participou da residência artística OneBeat (2018), durante a qual colaborou com músicos egressos de dezoito países diferentes. A música de Bruna é atravessada por elementos sonoros destes intercâmbios, entrelaçados com a música brasileira e o folk. A cantora reside em São Paulo desde 2019, ano em que lançou o EP "BLAR" (2019), estreia de sua carreira como compositora. Em 2021 lançou o single "Energia Solar", canção até então inédita de autoria de Paulo Leminski. Como intérprete, destacam-se os trabalhos "MEO" (2020), álbum produzido em parceria com o pianista Vinicius Bastos. Agora, a artista apresenta seu novo disco "Quem Faz Amor Faz Barulho", álbum de composições de Paulo Leminski, com produção musical de Ivan Gomes e participação especial de Kiko Dinucci.