“Assisti a 170 filmes em quatro meses”. Saiba como funciona a curadoria do Olhar de Cinema 05/06/2023 - 16:39

Felipe Worliczeck*

Neste ano, o Olhar de Cinema - Festival Internacional de Curitiba irá exibir 87 produções nas salas do Cine Passeio e do Cineplex Novo Batel, entre os dias 14 e 22 de junho. São longas e curtas-metragens, clássicos a novidades, em diversas categorias, como “Olhares Clássicos” e “Competitiva Brasileira” - veja a lista completa abaixo. Para explicar os critérios e processos que uniram tantas obras distintas, conversamos com Camila Macedo e Giulia Maria, duas das 9 curadoras e curadores do Olhar de Cinema.

Giulia Maria, de 21 anos, é graduanda em cinema e audiovisual pela UNESPAR. Ela fez parte da curadoria de curtas-metragens para o festival, e perdeu a conta de quantos filmes chegou a ver: “definitivamente mais que 300, provavelmente 450”. Ao todo, foram enviados para o festival 1.261 curtas-metragens. É a primeira vez que Giulia participa da curadoria do Olhar de Cinema. Ela possui experiência como cofundadora e curadora do Cine Adélia, cineclube negro em Curitiba. 

Camila Macedo, de 33 anos, trabalha com curadoria de cinema, é doutoranda no programa de Educação da UFPR e pesquisa sobre as lesbianidades juvenis em filmes de amadurecimento. Natural de Curitiba, ela trabalha com curadoria há seis anos e faz parte da equipe de seleção do Olhar de Cinema desde 2018. Para a edição deste ano, Camila assistiu a mais de 170 filmes para o festival, em casa, entre janeiro e abril.

De acordo com a curadora Giulia Maria, o critério usado para selecionar filmes é o “olhar”, verbo que o festival carrega em seu nome. “O principal critério que nós levamos em consideração do começo ao fim é: estamos olhando o que está sendo feito?”. Essa análise do cinema contemporâneo acaba necessariamente em um conjunto plural. “Por fim, o que buscamos são filmes que se destaquem por suas singularidades, sejam elas formais, temáticas ou mesmo ligadas ao contexto de produção do trabalho”, como destaca Camila Macedo, também curadora do festival deste ano. 

Equidade de gênero
Uma das obras que mais se destaca no Olhar de Cinema é “Jeanne Dielman” (1975), da diretora Chantal Akerman. O longa foi eleito “o melhor filme de todos os tempos” pela revista britânica Sight and Sound, após votos de milhares de críticos do mundo todo. Foi a primeira vez que um filme com direção feminina ficou entre os dez primeiros colocados da publicação. 

Para Camila Macedo, a preocupação do festival com a equidade de gênero não é nova, e é algo possível de ser atingido em mostras como o Olhares Clássicos, “na qual podemos atuar diretamente no reconhecimento da importância de filmografias e cineastas que, muitas vezes, sofreram apagamentos históricos”, afirma.

Giulia Maria, por sua vez, pontua que a inclusão é mais um produto do processo de seleção do festival. "A gente sempre vê na nossa curadoria se estamos olhando e dando espaço para esses grupos.” É o caso, por exemplo, de várias obras com temática indígena presentes no festival, como o longa “A Invenção do Outro” (2023), pauta revigorada também pela presença brasileira no Festival de Cannes, com a vitória de “A Flor do Buriti” (2023) em uma de suas premiações.

A divulgação de vozes originais e nacionais também é uma preocupação do Olhar de Cinema, como aponta Camila. “O cinema paranaense recente e o festival, de certa forma, andam juntos.” Esse aspecto da mostra é exemplificado pela escolha do filme de abertura, “Casa Izabel”, cujo diretor, Gil Baroni “[...] disse algo muito bonito após o convite para que o filme abrisse o festival. Ele falou sobre como o olhar dele, enquanto cineasta, foi também constituído pela sua experiência enquanto público do Olhar de Cinema. “

Giulia Maria ficou responsável pela escolha de curtas para o festival, espaço normalmente dedicado para diretores independentes e iniciantes, que aprendem novas técnicas em uma produção economicamente mais viável. “No processo de curadoria, nós vemos vários filmes com nomes novos, e isso desperta interesse para colocarmos essas obras na programação.”

Camila Macedo escolheu como destaque do Olhar de Cinema o filme “Salomé” (1923) - leia resenha aqui. “É um filme estadunidense centenário, que vale a pena redescobrir em função de suas características absolutamente únicas, que trazem muitos elementos que nos ajudam a pensar algumas vertentes dos cinemas queer das últimas décadas.” Já Giulia Maria escolheu um curta-metragem contemporâneo, chamado “A Mecânica dos Fluídos”, documentário sobre a subcultura virtual incel, vinculada a homens com frustrações sexuais, misoginia e terorrismo. A obra tenta recapitular a história que antecede o suícido de um integrante do grupo, e seus eventuais motivos.

Confira a lista de todas as mostras do Olhar de Cinema:

- Filme de Abertura e Encerramento

- Competitiva Brasileira (seção exclusiva para filmes nacionais inéditos)

- Competitiva Internacional (filmes inéditos de todo o mundo)

- Novos Olhares (filmes com apostas de experimentação)

- Mirada Paranaense (um panorama da produção audiovisual do nosso estado)

- Exibições Especiais (espaço livre para filmes selecionados)

- Olhar Retrospectivo (destaque a um grande nome do cinema mundial)

- Olhares Clássicos (filmes importantes na história do cinema)

- Foco (trabalho de um autor ou região pouco conhecida e acessível) 

- Pequenos Olhares (filmes dedicados ao público infantil) 

* Estagiário, sob supervisão de Cristiano Castilho